quinta-feira, 13 de maio de 2010

O CIÚME de Isaac Starosta

O CIÚME

O Ocidente está marcado por grandes obras dedicadas a Sua Majestade o Ciúme. De imediato eu lembro três: o Édipo, Otelo e Dom Casmurro, um clássico grego, outro renascentista e o último do realismo brasileiro. As épocas passam e o ciúme permanece. Quando eu me condoía tanto de Desdêmona, por ser vítima de Otelo, protótipo dos grandes ciumentos, eu pensava mais num cenário teatral ou operístico dentro de uma moldura histórica, mas hoje sei que o ciúme pode acometer a mãe, o amigo ou o vizinho de qualquer um de nós. E o ciúme, como tudo, só se for demais é prejudicial, quando brando pode até nos tornar mais atentos no trato com a pessoa amada.

Gosto das formas breves de literatura, daí eu me socorrer, para entender o ciúme, aos livros de aforismos, provérbios, pequenas boutades que dizem às vezes mais do que os longos desenvolvimentos conceptuais. Antigos e raros alfarrábios (ainda se usa esta palavra?) vivem comigo há bastante tempo, tais como “Biblia da Vida”, de Moraes Leal, livro português de começos do século XX, do qual aproveitei idéias tiradas de múltiplos autores, com estas:

“Os ciúmes de um namorado são uma homenagem, os de um marido são um insulto” (Carmen Sylva)

Assim sendo, senhores maridos, abstenham-se de demonstrar os ciúmes de vocês , mesmo porque omitir os sentimentos, embora pareça difícil, é algo que a gente vai aprendendo com o tempo!

“O ciumento não é já o amante que ama, mas o proprietário que se encoleriza” (Stahl).

Aliás, esta acepção de “proprietário” tem muito a ver com a antiga condição machista de que a mulher é uma propriedade do homem que a sustenta.

“O ciúme não provém do amor que se sente, mas daquele que se pretende inspirar” (Bellegaarigue).

E outra citação magistral, que poderia até matar o assunto:

“Há no ciúme mais amor-próprio do que amor” (La Roche-Foucauld)

De um livro de pensamentos de Schopenhauer, em francês (Ed Felix Alcan, 1885) traduzo :

“Os amantes são traidores que, perpetuando a vida, perpetuam a dor”.

E, dentro desse sentimento doloroso vivenciado pelo ciumento, estaria uma concepção trágica sobre o amor! Pois o ciumento, na impossibilidade de amar, transforma o seu amor em ódio, usando o ciúme como álibi.

Aliás, do extraordinário livro “Millôr Definitivo” gostaria de mencionar uma idéia semelhante à anterior:

“O ciúme é o álibi de quem não ama”.

E é na Arte que aparece o verdadeiro retrato do ciúme que, vivenciado como algo misterioso, sub-reptício, e que, permanecendo submerso poderia desembocar na violência, porém, revelado por ela, Arte, passa a ser devidamente conscientizado pelas pessoas.

Dos dicionários sempre se aprende alguma coisa. Para Houaiss, ciúme é “Sentimento causado pelo receio de perder o afeto de alguém para outrem”. Para a Academia Brasileira de Letras, seria “Sentimento penoso causado pela pretensão real ou suposta de outrem em relação à pessoa de que se quer o amor exclusivo”. E do antigo Dicionário Etimológico de Antenor Nascentes, fico sabendo que a palavra ciúme provém de “cio”. Donde se infere que este amor exclusivo que se pretende, visa eliminar outros concorrentes, isolando assim alguém que está no cio para nos garantir a descendência.

Noto que existe, paralelamente, em quase todas as citações que eu fiz, um elemento comum: o ciúme é um medo de perder, de se frustrar e que traduz mais orgulho e sentimento de posse do que amor.

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